É considerado bem estranho, para um tecladista profissional, falar sobre instrumentos OEM - em outras palavras, aqueles "genéricos", de valor super baixo no mercado, geralmente voltados a iniciantes e hobbystas, que muito são encontrados em sites de lojas de departamentos por aí. Mas, sendo alguém curioso, que pensa totalmente fora da caixa quando o assunto é instrumentos, então sim, vou falar sobre esses teclados - e mais: vou relatar minhas próprias experiências com eles.
Toda vez que vejo esse tipo de instrumento anunciado, a primeira coisa que me vem à mente é uma matéria de um exemplar de 2004 da revista Teclado & Áudio, a qual eu assinava naquela época. A matéria em questão era sobre um teclado Fenix TB-6150, e lembro bem que a mesma foi anunciada assim, no cabeçalho ou no rodapé da capa:
Fenix TB-6150: conheça a novidade que veio da China
Esse título me chamou a atenção e a primeira coisa que fiz foi procurar a tal matéria dentro da revista. Achei a mesma e comecei a lê-la. Lá foram mostradas todas as características do teclado Fenix TB-6150, tendo fotos grandes e uma explicação detalhada de tudo. Pelas fotos, o instrumento em si era visualmente bonito, todo prateado, contando com um visual clean, display amplo e relativamente poucos botões no painel. Logo após ler aquela matéria, fiquei pensando em como seria, na prática, tocar com um instrumento daqueles. Fui ter a experiência no ano seguinte.
No verão de 2005, enquanto de férias com a família na casa da praia, eu não tinha nenhum instrumento em mãos. Meu velho teclado Technics havia sido vendido após passar por manutenção caríssima devido a um descuido do operador da mesa de som antes de um evento em dezembro do ano anterior, que quase acabou com o instrumento. Só fui com meu pai atrás de um novo na volta das férias, quando já era final de fevereiro ou começo de março - aí encontramos um Yamaha DGX-205, que, embora tivesse mais teclas, também tinha menos recursos. No começo, não havia nada de mais nisso, pois, naquela época, meu trabalho envolvia mais era piano mesmo; porém, com o tempo, fui precisando de mais timbres, aí aproveitei a oportunidade para, enfim, ver se achava o teclado Fenix TB-6150 anunciado naquela revista.
Fenix TB-6150, em foto retirada do Facebook -
fonteEu e meu pai fomos à extinta loja Agevê Music, em Novo Hamburgo-RS, atrás do TB-6150. Não tinha mais esse instrumento; o que tinha naquele momento era outro da mesma marca, um TB4000D, com maior polifonia (64 vozes), roda Modulation, dentre outras características a mais. Eu estava muito curioso com a marca só por ter lido aquela matéria, aí escolhi o TB4000D por isso.
Fenix TB4000D, em foto retirada do site AudioFanzine -
fonte
Tive relativamente pouca experiência com o TB4000D, coisa de uma ou duas semanas, no máximo. No começo, foi legal, pois o som interno dele era alto, tinha uns timbres legais e tal. Porém, fui notar que a parte do acompanhamento automático estava com sérios problemas. Além disso, a mecânica das teclas era bem esquisita, nem sei como descrevê-la. Resultado: o TB4000D foi logo substituído por outro teclado, dessa vez um de marca "de verdade", um Roland EM-50, sobre o qual eu também tinha lido uma matéria numa edição ainda mais antiga da revista Teclado & Áudio (à época chamada Cover Teclado), de 2000. Meu set naquela hora ficou como mostra a foto abaixo:
Yamaha DGX-205 e Roland EM-50 em 2005 - fonte: arquivo pessoal
Por muitos anos, desde o dia em que aquele teclado Fenix TB4000D foi substituído pelo Roland EM-50, nunca mais botei as mãos em nenhum instrumento OEM. Eu tinha para mim que realmente não valia a pena, que era só incomodação, que era dinheiro posto fora etc.. Assim foi até 2018, quando encontrei um teclado Medeli mc780 no site de uma grande loja de departamentos a preço super promocional. Apesar de que os instrumentos Medeli não se encaixam exatamente na categoria OEM, pois trata-se de uma marca real, fundada em Hong Kong em 1982, mas a empresa também fabrica instrumentos para marcas famosas, como Korg, Kurzweil etc., então, digamos que seria "meio OEM", mas enfim...
Quando vi o Medeli mc780 no site daquela loja, de imediato me veio a lembrança do Fenix TB4000D. Relutei muito em fechar a compra, pois eu não queria mais passar por problemas sérios como daquela vez. Mas, em todo caso, comprei o instrumento, que chegou poucos dias depois.
Medeli mc780 no dia da chegada, em 2018 - fonte: arquivo pessoal
Confesso que, quando o Medeli mc780 chegou, fiquei um pouco nervoso, achando que logo em seguida seria necessário trocá-lo, como foi o caso do Fenix TB4000D lá em 2005. Eu já estava preparado para ter que dar um monte de explicações quando, de surpresa, descubro uma série de coisas boas no instrumento: timbres muito usáveis ao vivo, teclas confortáveis, som interno poderoso (não que eu fosse precisar disso, no entanto - estaria OK se o teclado não tivesse falantes internos), super fácil de operar, construção robusta etc.. O resultado foi que fiquei com o teclado por um bom tempo, cerca de dois anos, só o vendendo no início de 2020 por precisar de dinheiro para outros objetivos. Inclusive cheguei a usá-lo nos palcos, com ótimos resultados.
Medeli mc780 e Yamaha MX61 no palco para um show em SC - foto: arquivo pessoal
A partir daí, minha curiosidade sobre essas marcas "desconhecidas" só aumentou e, desde então, fiquei pesquisando sobre esses instrumentos, em sua maioria fabricados na China e distribuídos pelo mundo por diferentes marcas (não é o caso da Medeli, no entanto; esta é uma marca oficial). Encontrei muitos deles anunciados por aí, e também vi vários vídeos no YouTube onde tecladistas apareciam tocando com eles, mas, nesses últimos, a grande maioria apenas tocava com o timbre padrão de piano, sem dar nenhuma ideia dos outros sons - o que só aguçou ainda mais minha curiosidade, a ponto de eu ir atrás de um desses para saber mais. Foi aí que descobri, em outra loja, esse Benoá JK-60 (detalhe: "Benoá" só no Brasil; na China é "Joy", e por aí vai):
Benoá (Joy) JK-60 - foto: arquivo pessoal
Esse deve ter sido o teclado mais barato da história do meu
set: menos de R$300,00. Comprei-o no ápice da curiosidade, exatamente por ser super barato. E não é que consegui tirar alguma coisa dele? Claro, nada comparado aos bons timbres do Medeli mc780, aqui o som era bem mais "quadrado", "artificial", mas, ainda assim, mantendo o Sustain e o Vibratao acionados, e escolhendo alguns timbres-chave, obtive uns resultados bem interessantes - algo etéreo, eu diria. Um desses resultados sonoros está nas faixas 1 e 4 do meu álbum mais recente, "Infinities..." (maiores informações
aqui) - no caso, não usei meu primeiro exemplar do JK-60, que acabei vendendo por motivos de aperto financeiro, e sim outro igual, que peguei na mesma loja tempos depois.
Ainda hoje sigo vendo muitos anúncios desses teclados OEM, tanto novos quanto usados, e sempre fico pensando em que tipo de som eu conseguiria tirar deles, se eu tivesse a chance de testá-los. Muitas vezes até penso em encomendar qualquer um deles, em nome da curiosidade. Algo que vejo como "vantagem" (se é que essa palavra é adequada) é o fato de nenhum deles seguir o padrão
General MIDI (pois, se fosse o caso, eu já saberia quais timbres seriam, aí não teria muito o porquê de pesquisar) - aliás, a grande maioria deles sequer tem MIDI, apenas conexões de áudio (e boa parte deles conta apenas com a saída Phones). Imagino ser esse um dos fatores de esses instrumentos custarem tão barato.
Enfim, por experiência própria, já consegui umas gratas surpresas desses instrumentos "desconhecidos", e não me espantaria se, ao encontrar outro desse tipo, eu descobrisse mais algumas... Quem sabe, em algum momento logo ali? Talvez...
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